Estou a ministrar uma disciplina de História no “campus” da UERR em São João da Baliza (RR). Até o momento o registro acadêmico não soube informar quantos alunos estão efetivamente matriculados na disciplina. De qualquer forma, só um aluno apareceu mesmo até hoje (terceiro dia da disciplina).
Como de praxe na maioria dos municípios do interior, a cidade não parece oferecer muitas perspectivas a seus habitantes. Ruas (muito) esburacadas, praças e obras governamentais abandonadas, grandes áreas desmatadas e depois deixadas ao domínio da capoeira e das ervas daninhas. O próprio site da prefeitura mostra como foto de divulgação da cidade uma rua em situação lastimável (http://www.pmsaojoaodabaliza.com.br/novo_site/popup.php?ID=9). O prédio da polícia militar está em péssimas condições. Nas escolas públicas, a mesma situação de muitas escolas da capital: paredes sujas, excrementos de pombo acumulados nos cantos. Falta energia elétrica com alguma frequência. A cidade é (des)servida pelos ônibus sucateados da Eucatur e por aquelas vans precárias e xexelentas. Já viajei em pé de São Luís a Boa Vista (mais de 8 horas de viagem), pois a Eucatur não vê nenhum problema em vender mais passagens que lugares. É impossível crer na existência de qualquer tipo de fiscalização dessa porca empresa de ônibus, que mostra total desprezo pelos passageiros. Fala-se em vastas áreas de lotes destinados ao assentamento comprados irregularmente por determinados deputados, que formaram dessa maneira grandes latifúndios.
O comércio da cidade parece ser bem movimentado e algumas casas estão bem cuidadas. O que mais chamou a atenção ao chegar na casa de apoio (alojamento dos professores) foi o gramado, a ausência de muros e uma bela samaúma no pátio. Infelizmente, um colega professor já me alertou que essa calma é enganadora, pois sua máquina de lavar já foi roubada de sua casa.
O prédio da UERR é vistoso, situado logo na entrada da cidade. Conta com umas dez salas de aula, espaço para biblioteca e para um auditório, bem como para umas 2 ou 3 salas administrativas. Tanto a área livre para uma possível expansão quanto o auditório foram subdimensionados, como de hábito. O prédio já foi planejado sem salas para os professores. Um loteamento está sendo aberto logo nos fundos do prédio e um estranho posto de gasolina quase fecha a frente do “campus”. As instalações são improvisadas. Ao que parece, um trator do loteamento vizinho destruiu o encanamento do prédio, deixando a universidade sem água. E ficou por isso mesmo. Os banheiros tem luzes de acendimento automático, acionadas por sensor de movimento – mas não há verba para papel-toalha. Cheguei em um domingo chuvoso, o que permitiu ver com meus próprios olhos como a tempestade entra livremente pela cobertura do prédio, formando uma cachoeira nas escadas e alagando parcialmente os corredores. A compra dos móveis está atrasada há mais de um ano, o que é alegado como justificativa para o fato deste prédio – e mais uns 4 ou 5 idênticos em outras cidades do interior – nunca terem sido inaugurados, apesar de estarem praticamente prontos.
Fui informado que os prédios dos campi de São João e Rorainópolis foram ocupados pelos alunos, cansados de ver o patrimônio público ser dilapidado pela ação do tempo, permanecendo em dependências improvisadas e dilapidadas de uma escola estadual. Com o fato consumado pelos alunos, organizados em um centro acadêmico, o diretor – homem honesto, competente e zeloso – tenta em vão sensibilizar as instâncias superiores a liberar recursos para reparos emergenciais. Ele e os funcionários esforçam-se ao máximo para garantir a limpeza e a organização do ambiente. Com todas as dificuldades, mostram empenho, lealdade e profissionalismo.
Com o mais recente concurso de professores da UERR, realizado em 2011, um grande número de mestres e doutores de São Paulo, Minas Gerais e outros estados vieram morar em Roraima. Vários fixaram residência no interior, cheios de energia, conhecimento e vontade de contribuir no desenvolvimento da universidade e do povo roraimense. Mas até que ponto uma universidade sozinha pode atuar como indutora de desenvolvimento? Como enfrentar o câncer da incompetência administrativa, da corrupção e do desperdício de dinheiro público que devasta Roraima? Até quando esses valorosos professores ficarão na UERR se não houver condições mínimas de trabalho?